A Prefeitura de Foz do Iguaçu acerta para definir quais ações e projetos são essenciais, através do Orçamento Participativo (OP), para o desenvolvimento de todas as regiões da cidade, diz o sociólogo Felix Sanchez, 63 anos, um dos criadores e coordenador do programa por duas vezes em São Paulo (1989-1992 e 2001-2004).
"É um caminho super certo que vai acabar contribuindo muito no estabelecimento de uma relação de maior qualidade, inclusive no desenvolvimento de outras políticas, de assistência, de atendimento à população de vulnerabilidade. Essa âncora na escola é muito importante, porque é um mecanismo de chegar nas periferias das cidades, de um jeito mais efetivo", disse Feliz Sanchez, autor do livro "Orçamento Participativo, Teoria e Prática".
Em 2021, a segunda edição do OP projeta R$ 50 milhões em investimentos nas cinco grandes regiões de Foz do Iguaçu. A escolha majoritária para obras em educação, acredita Felix Sanchez, é uma tendência daquilo que chama de "orçamento participativo criança", uma experiência que está sendo levada em todos os continentes do mundo como uma política pública participativa e inovadora.
Nesta entrevista, o sociólogo fala mais da experiência que começou em Porto Alegre, replicada em São Paulo e outras mil cidades brasileiras a partir dos anos de 2000. Felix Sanchez tem 63 anos, é professor universitário, e atuou ainda no governo paraguaio entre 2008-2012.
Quando foi criado o orçamento participativo?
O Orçamento Participativo foi criado na década de 80 e sua primeira experiência foi em 1989 na prefeitura de Porto Alegre. Essa foi a primeira grande experiência que mostrou ser uma inovação na gestão das cidades. É tão potente que hoje está espalhada nos cincos continentes do mundo em cidades e capitais importantes.
Dessas experiências em Porto Alegre e em São Paulo, algumas se tornaram políticas públicas ou não?
Foram todas muito importantes. Em primeiro lugar, na gestão territorial da cidade. Em que sentido? No sentido que o OP tem funcionado como um mecanismo importante de governança propícia. De um lado a participação das comunidades e dos moradores. Para conseguir apontar, controlar, fiscalizar e gerir uma melhor administração dos serviços públicos e dos recursos aplicados para atendimentos das ações dos governos locais.
Nesse aspecto, a boa experiência que recorre às políticas públicas nas cidades se desdobra no aspecto da gestão dos serviços públicos aplicados em setores residenciais, como saúde e educação. Também na gestão dos territórios porque atende justamente uma administração mais racional das regiões em que se divide a cidade, e aí esse elemento que permite diminuir as desigualdades sociais por meio da participação ativa dos cidadãos.
Nesse sentido, poderia apontar por vários caminhos a contribuição das experiências das políticas públicas. Mas o interessante é ver que, por exemplo, hoje temos OP em Nova Iorque (EUA), em Londres (Inglaterra), só para dar exemplos.
Como está o OP em outras cidades e fora do Brasil?
Esta é uma política que deu certo, porque hoje está sendo praticamente consagrada a um processo que vem desde 1989 até o dia de hoje. É uma experiência que teve mais sucesso no ponto de vista de gestão das cidades, encorajou o desenvolvimento de um novo olhar mais sensível aos problemas mais tocantes, mais urgentes das populações. Por conta disso acabou se legitimando e ganhando uma grande autoridade de um ponto de vista das experiências.
O senhor falou de Nova Iorque e Londres, quais outras cidades?
É uma lista enorme. Vamos começar pelo Brasil, depois de Porto Alegre, isso pula para outros países da América Latina, desde a Ciudad del México, em Guatemala, em El Salvador. Na América do Sul, tem experiências muito importantes no Equador, na Colômbia, no Chile, na Argentina, no Paraguai e na capital Asunción já passou por uma experiência do OP.
Na América do Norte, foi o caso de Nova Iorque e várias cidades dos EUA, que também é um continente quase igual ao Brasil. Depois Paris, que é uma das experiências também muito importante que estão sendo desenvolvidas, além de várias outras cidades da França, em Londres, na Bélgica, na África, Moçambique. Vários países africanos têm OP, na Ásia, a Índia também tem várias cidades. Então, digamos que o orçamento participativo é um processo que está em ascensão no mundo.
O senhor falou a respeito de OP Criança. Como é esse modelo?
A primeira grande experiência foi feita em São Paulo quando coordenava o OP na prefeitura. Na verdade, comecei a implantar e a partir de 2002. Estabeleci uma discussão através do Observatório Internacional de Democracia Participativa que participei da sua criação e fiz parte do seu conselho diretor com experiência na Espanha, em Barcelona.
O pessoal da prefeitura de Barcelona somou uma discussão muito interessante, inclusive um debate que trouxemos para cá, que é justamente sobre mecanismos para melhorar a qualidade do ensino pelo estímulo da participação comunidade de educação que são os pais, os professores trabalhadores e os próprios estudantes. A partir disso começamos a desenvolver, em 2003, mais intensamente em 2004, um OP para crianças. Esse processo, inclusive, alicerçou a candidatura de São Paulo já em 2004 no torneio mundial de cultura em Nova Iorque e simultaneamente em Seul, na Coreia do Sul.
Levamos o prêmio de experiência mais importante nesse torneio mundial de cultura. Recebi o prêmio pessoalmente, pela área de ajuda humanitária. A premiação foi feita em 2004 e reconheceu o OP em geral, mas também o OP Criança, como um mecanismo de inovação muito importante de participação e esse processo continuou se espalhando.
Estava esquecendo de mencionar Lisboa (Portugal), que é uma cidade que abraçou a proposta e hoje em dia o OP entre os países de língua portuguesa, certamente é uma das experiências mais importantes, porque combina, na verdade, uma preocupação com o problema da educação justamente na educação na infância, mas dentro de uma concepção também mais larga, mais ampla, porque o processo educacional é entendido mais contemporaneamente, que envolve todas cidades.
O processo da educação que tem o apoio da escola na formação da criança, do jovem, depois do adulto, até o idoso, é muito importante. E o OP, nessa perspectiva de uma educação integral, que abrange todas as etapas das vidas dos seres humanos, é compreendido como um elemento que contribui com a melhoria da qualidade de vida das pessoas, isso em todos os países e em todos os lugares.
Foz do Iguaçu está na segunda edição do OP. Na primeira, as escolhas foram nas áreas de infraestrutura, mas nessa foi colocado até um limitador, por exemplo R$ 10 milhões na região sul, R$ 9 milhões foi para educação. Na região Leste foi colocado um limitador de R$ 6 milhões. Então, a própria comunidade, os professores estão se organizando em relação a usar a verba ou prever o recursos para educação. Nessa avaliação, o senhor considera que Foz do Iguaçu está no caminho certo?
Super certo e acho que é uma orientação que vai acabar contribuindo muito no estabelecimento de uma relação de maior qualidade, inclusive no desenvolvimento de outras políticas, de assistência, de atendimento à população de vulnerabilidade e por causa disso, essa âncora na escola é muito importante. Porque é um mecanismo de chegar nas periferias das cidades, de um jeito mais efetivo, mais tranquilo, porque tem uma vida cotidiana importante, é um serviço essencial.
O senhor falou também sobre o OP em cidades do Paraguai, além de Asunción, tem mais alguma cidade? Como está o OP lá?
O OP é uma experiência que acabou sendo interrompida. Em Asunción, houve uma mudança e o Partido Colorado retomou a prefeitura e interrompeu. Por outro lado, tem Encarnación, que fica ao sul do Paraguai. O candidato a prefeito Luiz Yd, que é candidato à reeleição, deve assumir o OP como uma orientação. Já recebi o contato do pessoal da equipe da campanha de governo. Eles estão muito interessados em implantar.
Também em Ciudad del Este estão querendo implantar?
Miguel Pietro está com 60% (nas pesquisas). É possível que implante e vai ser muito importante a experiência do OP. Acho que na articulação até com Foz do Iguaçu, que é uma cidade-gêmea, seria muito legal e importante para eles.
Qual sua formação?
Sou sociólogo, agora aposentado. Minha formação, sou professor, doutor, fui professor titular na PUC de São Paulo, na universidade federal de São Paulo. E trabalhei no governo (Fernando) Lugo, coordenando e atuando como assessor da Presidência da República e de participação na gestão.
Eu posso dizer que o senhor é um dos criadores do OP?
Não fui o criador porque não estava em Porto Alegre, estava em São Paulo. Acompanhei de perto a implantação dessa política, e mais que isso, fui responsável pelo reconhecimento, pela premiação, inclusive do OP enquanto política e em 2004 quando ela estava sendo implantada em São Paulo, foi um reconhecimento mundial.
fonte: Assessoria
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